A prática e abordagem tradicional de promover a drenagem de águas residuais e pluviais em meio urbano perdura, na Europa, há cerca de dois séculos.
O modelo da cidade europeia, com as suas vias pavimentadas, lancis, sarjetas, redes de abastecimento de água, de águas residuais e pluviais, canalização de linhas de água, e redes de instalações elétricas e de comunicações, revela um padrão dominante que ainda se encontra bastante vulgarizado na atual “bonita cidade moderna”.
E as cidades expandiram-se e desenvolveram assentes na rede de serviços que esses sistemas de infraestruturas criticas (“life lines” na terminologia anglo-saxónica”) proporcionam.
No entanto, a expansão das cidades, as alterações dos padrões de consumo, as alterações climáticas, a escassez de recursos, a crise económica e a pressão ambiental tem tido lugar a um ritmo que parece tornar toda a problemática da gestão da drenagem e destino final dos efluentes da cidade uma missão cada vez mais complexa, onerosa e desafiante, não compatível com os antigos modelos de resposta, em termos de prestação de serviços.
Mudou o “espirito do tempo” e a nova “sociedade” requer, para além de um adequado desempenho das infraestruturas em termos de proteção da saúde pública e do ambiente em geral:
a) Maior eficiência das soluções, no que se refere à utilização de recursos;
b) Investigação e desenvolvimento de novas abordagens, centradas na sustentabilidade;
c) Nova arquitetura das soluções de engenharia, com articulação com outros setores;
d) Procedimentos de gestão e decisão transparentes e participados.
Mesmo nos países desenvolvidos, as dificuldades de um desenvolvimento sustentado revelam-se frequentemente em aspetos como a degradação de meios recetores, a ocorrência de inundações, episódios de libertação de odores ofensivos ou atmosferas tóxicas ou corrosivas, ou custos agravados para suportar os serviços.
Os aspetos anteriormente referidos refletem problemas preocupantes, dado que não são em regra passíveis de ser resolvidos de forma eficaz recorrendo aos procedimentos tradicionais de execução de coletores cada vez mais longos e que descarregam em Estações de Tratamento de Águas Residuais (ETAR) cada vez mais amplas, complexas e com maiores exigências em termos de competências de operação e manutenção.
Nesse quadro, e em áreas com baixas densidades de ocupação, tem ganho expressão abordagens mais descentralizadas, com drenagem e tratamento locais, e com soluções de base natural, pouco exigentes em termos de consumos de água, energia e materiais, e pouco exigentes em termos de competências de operação. Entre essas soluções incluem-se as de lagunagem e de leitos de macrófitas ou fito-ETAR. As soluções de tratamento de águas residuais no solo, por infiltração rápida, infiltração lenta ou escoamento superficial, também se podem considerar como soluções de tratamento de base natural.
No caso das águas pluviais, o panorama geral é análogo. As soluções de cariz exclusivamente centralizado, com transporte de caudais a longas distancias agravam, em regra, os custos de instalação e a magnitude de prejuízos económicos, sociais e ambientais no caso de eventos extremos de precipitação, se não forem articuladas e complementadas com outro tipo de soluções.
Novos paradigmas, ou seja, novos modos e formas de pensar, têm vindo progressivamente a ganhar relevo, com impacte no planeamento das intervenções. Nessa ótica, constituem palavras chave: as soluções verdes e as soluções de controlo na origem de águas pluviais; a sustentabilidade, em que se dá naturalmente ênfase à preservação de recursos energéticos, de matérias primas e de mate riais; a resiliência dos sistemas, no sentido da celeridade de recuperação das suas funções perante eventos extremos, e a consulta e participação pública, como aspeto relevante de suporte à tomada de decisão.
Nos últimos 5 anos foi expandido, no âmbito da International Water Association (IWA), o conceito de cidade consciente na gestão da água, ou cidade hidro-sensata (em terminologia anglo-saxónica “water-wise cities”). Um comportamento hidro-sensato significa que a cultura, a preparação das decisões, a capacidade profissional e a inovação tecnológica se encontram alinhadas com o objetivo comum de potenciar e maximizar os resultados de uma gestão eficiente e sustentável da água, de forma inclusiva, nas suas dimensões económica, social e ambiental.
Outro conceito relativamente recente, é o da “cidade-esponja”. Embora este conceito seja recente, as técnicas a que recorre são conhecidas há muitas décadas. Entre essas técnicas incluem-se, por exemplo, os telhados e paredes verdes, os pavimentos drenantes, as trincheiras filtrantes, os poços absorventes, os parques alagáveis e as bacias de retenção com toalha de água permanente. As técnicas alternativas apresentam, relativamente às soluções tradicionais de rede de coletores enterrados, importantes vantagens, mas exigem, em contrapartida, uma abordagem diversa em termos de conceção, uma nova atitude em termos de diálogo e articulação com outros agentes da intervenção urbana, um conhecimento claro das suas limitações e, consequentemente, dos respetivos domínios de aplicação e de exclusão.
Muitas vezes, em face das diferentes tipologias urbanas e dos seus condicionalismos e restrições, a solução recomendável para a drenagem urbana de águas pluviais passa por combinar soluções verdes, baseadas em retenção e infiltração, com soluções “cinzentas”, baseadas em transporte das águas a destino final, com sistemas contínuos de monitorização e de aviso e alerta, que permitem à cidade ficar mais adaptada à incerteza climática e também mais sustentável, em termos da qualidade dos serviços que proporciona.