Artigos de Opinião

Cristina Silva, Carlos Cruz, Inês Teotónio: “Construção Sustentável e Coberturas Verdes em Portugal”

Cristina Matos Silva,
CERIS, Departamento de Engenharia Civil, Arquitectura e Georrecursos, Instituto Superior Técnico, Universidade de Lisboa

As pressões exercidas sobre os ecossistemas e o consumo excessivo dos recursos naturais torna inquestionável a necessidade da adoção de soluções sustentáveis e resilientes. É neste contexto de consciencialização social e ambiental, e tendo em vista as condições de vida das gerações futuras, que têm sido implementadas diversas soluções de base natural como medidas eficazes de repensar o espaço urbano construído. O processo de desenvolvimento destas soluções pretende recriar processos naturais, tendo como principal intuito repor os serviços ecossistémicos perdidos durante o processo de urbanização. Entre as soluções de base natural referidas anteriormente, investigadores do Instituto Superior Técnico (https://www.projectgenesis-ist.com) têm-se centrado no estudo das coberturas e fachadas verdes. Estes sistemas construtivos de coberturas e fachadas verdes permitem contornar a questão da elevada taxa de ocupação da área de solo nas cidades, a qual está tipicamente associada a custos consideráveis. Neste sentido, é possível tirar partido do património construído existente e, através da incorporação de materiais vivos na sua envolvente, melhorar a capacidade de filtração de poluentes atmosféricos e aumentar a área permeável de modo a promover o escoamento e atenuar a sobrecarga dos sistemas de drenagem pluvial, entre outros benefícios (Berardi et. al, 2014).

A aceitação de novos planos e orientações políticas depende, ainda que não exclusivamente, de uma posição económica favorável com a garantia de uma correta utilização dos fundos públicos. No caso de investimentos privados, a viabilidade financeira é decisiva para a afirmação destas soluções. Esse desempenho de coberturas e fachadas verdes é condicionado por inúmeros aspetos, nomeadamente pelas condições do projeto, sendo que nem todos os cenários poderão ser favoráveis à sua implementação. Neste sentido, é importante analisar o potencial contributo económico destas soluções e testar possibilidades de aplicação distintas, nomeadamente através da contabilização das perspetivas dos investidores e/ou utilizadores em múltiplos cenários de instalação.

O Guia Técnico Infraestruturas Verdes: Análise Custo-Benefício (Silva et al., 2018) foi desenvolvido no sentido de propor uma metodologia de avaliação económica a coberturas e fachadas verdes. A metodologia apresentada visa equacionar os custos e os benefícios provenientes da instalação destas soluções numa perspetiva a longo prazo, atendendo a que a generalidade dos impactos não é percetível no imediato. A metodologia proposta foi posteriormente particularizada para a aplicação de coberturas e fachadas verdes em diferentes contextos, designadamente edifícios privados, edifícios públicos e infraestruturas de transporte. Entre diversas aplicações a casos práticos apresentadas no Guia Técnico, salienta-se o caso de estudo da cidade de Lisboa, Portugal. À semelhança de várias outras cidades europeias, Lisboa tem apostado numa abordagem de desenvolvimento sustentável, sendo inclusivamente nomeada Capital Verde Europeia 2020. O município tem adotado várias iniciativas de forma a melhorar a qualidade de vida dos cidadãos e mitigar os efeitos das alterações climáticas, como, por exemplo, a criação de espaços e corredores verdes. Neste âmbito, as coberturas verdes surgem como exemplos mais escassos, mas igualmente significantes. A cobertura verde da ETAR de Alcântara é possivelmente um dos mais simbólicos exemplos, mas existem vários outros casos dispersos por toda a cidade tais como a cobertura verde da Fundação Calouste Gulbenkian e mesmo edifícios privados.

A cidade de Lisboa apresenta problemas urbanos que podem ser atenuados através da introdução de vegetação no espaço urbano, em particular questões de temperatura ambiente elevada e baixa qualidade do ar, bem como alguns episódios de inundações após eventos de precipitação intensiva por curtos espaços de tempo. Neste sentido, a aplicação da metodologia de análise custo-benefício a este caso de estudo teve como intuito de testar o impacto económico da instalação de coberturas verdes num contexto de aplicação em larga escala em áreas densamente construídas, o qual se prevê ser especialmente vantajoso. Para proceder a esse estudo, foram identificados todos os edifícios habitacionais e de comércio em Lisboa aptos para receber os sistemas de coberturas verdes no imediato. Estes edifícios foram analisados em termos de capacidade estrutural e inclinação máxima da cobertura, perfazendo um total de 10.164 edifícios compatíveis com a intervenção de reabilitação pretendida, equivalentes a uma área de implementação de 1,5 milhões m2. Esta caracterização detalhada do parque edificado lisboeta teve como principal motivação excluir custos significativos de reforço estrutural que poderiam, eventualmente, tornar a estes sistemas consideravelmente menos viáveis na perspetiva do promotor do projeto. Para além disso, permitiu também contabilizar questões normativas de conservação do património que impedem intervenções profundas em edifícios antigos (como o caso da Baixa Lisboeta, por exemplo).

 Os resultados da análise custo-benefício ao longo de um período de 40 anos comprovaram, numa perspetiva socio-ambiental, o contributo económico das coberturas verdes em espaços urbanos, sendo que uma aplicação globalizada de coberturas verdes na cidade de Lisboa poderia potenciar um retorno total de aproximadamente 318 milhões de euros. Com base numa análise mais detalhada ao nível das freguesias, foi possível demonstrar que as áreas com maior valor apresentam um parque edificado construído mais recente, como por exemplo as freguesias do Parque das Nações e Olivais, por oposição às freguesias de Santa Maria Maior, Beato e São Vicente.


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