Artigos de Opinião

Frederico Brandão: “Notícias da Amazônia”

Frederico Brandão,
Doutorado em Geografia e cientista português do CIFOR-ICRAF (Center for International Forestry Research and World Agroforestry)

A Amazônia tem apenas duas estações: uma seca e uma húmida. A estação seca, que agora se inicia, é uma época de alegria e inspiração. Em muitos lugares do delta do Amazonas, o açaí começa a inundar os mercados sinalizando que a safra começou. É o tempo das populações que vivem deste fruto – ribeirinhos – ganharem dinheiro e aproveitarem, por exemplo, para fazer obras nas suas palafitas ou arranjos nos seus barcos. Nas principais capitais a qualidade de vida sofre alterações. Os alagamentos abrandam e o com isso o cheiro a esgoto diminui e o trânsito caótico acalma. É o fim das chuvas, em especial o fim das chuvas da tarde, que traz uma nova energia e dinâmica à população. Os fins de tarde ficam mais longos e mais agradáveis. As crianças brincam na rua com mais liberdade e os boêmios começam as festividades mais cedo.

A estação seca é também a favorita de turistas e veraneantes. O caudal dos rios baixa e formam-se praias e ilhotas logo aproveitadas para todo o tipo de lazer. No delta do Amazonas, a força da água barrenta do rio amaina e com isso a água do oceano ganha novo fôlego invadindo áreas outrora ocupadas pela turbulência da água do rio. Praias de água barrenta com aspecto triste ficam assim mais vivas e límpidas e como resultado, a economia destas regiões é estimulada com a vaga sazonal de clientes que começa a chegar.

Porém, a chegada da estação seca é também sinal de más notícias para a Amazônia e para o mundo. Todos os anos por esta parte, as estatísticas oficiais começam a sinalizar o início da época das queimadas. Os verões Amazônicos são também a época em que os desmatamentos, que vêm sendo preparados durante os meses da chuva e estão muitas vezes relacionados com queimadas ou são escondidos pelas nuvens dos primeiros meses do ano, são efetivados e entram nas estatísticas oficiais. Este ano as notícias não serão muito diferentes. Independentemente de haver divulgação nos meios de comunicação ou nas redes sociais, não esperem melhorias significativas deste canto do planeta.

Vamos aos números. No ano de 2020 – tecnicamente entre Agosto de 2019 e Julho de 2020 – foram destruídos 10,9 mil quilômetros quadrados de floresta segundo o sistema oficial Brasileiro – PRODES. Este tamanho equivale a cerca de duas vezes a área dos distritos de Porto e Lisboa somados. Para o ano de 2021 ainda não há números finais – o ano PRODES fecha a 31 de Julho e os dados consolidados são divulgados alguns meses depois. Contudo, os dados preliminares disponíveis indicam uma tendência semelhante à do ano anterior para o período homologo. Pelos corredores das instituições que acompanham a Amazônia o pessimismo domina: 2021 dificilmente será melhor que 2020. Isto apesar de todo os esforços realizados, dinheiro investido e da massiva pressão internacional que provavelmente não se repetirá este ano. Para terem uma noção, no ápice da crise dos incêndios de 2020, o Supremo Tribunal Federal – o equivalente ao Tribunal Constitucional em Portugal – decidiu alocar cerca de 170 milhões de euros do fundo da Petrobrás para financiar ações federais e estaduais de combate a desmatamento. Este dinheiro somou-se ao orçamento ordinário que união e estados dispõem anualmente para financiar este tipo de ações e às múltiplas contribuições de organizações internacionais e outros doadores – que juntos somam pelo menos várias dezenas de milhões de euros anuais.

Gostaria de vos trazer melhores notícias, mas infelizmente para este ano não dá. Quem sabe no próximo. Nas margens de tudo o que vos falei há coisas boas que estão a ser feitas. Há esperança no futuro, mas isso será tema para outra crónica.


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