Artigos de Opinião

David Viana: “Perspetivas para o desenho urbano: entre a ação-prática e as novas dinâmicas digitais”

David Leite Viana
CMP, DMPOT; ISCTE-IUL, ISTAR-IUL

Tem ficado cada vez mais evidente que o desenho urbano se confronta com novos desafios ao nível da sustentabilidade dos ambientes construídos que precisamos assegurar, de facto, na década que agora começa. A nova arquitetura urbana responde à incerteza e à imprevisibilidade em espaços de interação social gradualmente desdobrados entre o físico e o digital, com problemáticas ecológicas agudizadas pelas alterações climáticas e sujeitos a lógicas económicas em ajustamento devido a fragilidades sistémicas (que ficaram mais expostas pela crise sanitária que vivemos, com a pandemia da Covid-19). O caminho a percorrer é o da prossecução coletiva de uma nova arquitetura urbana na convergência entre o estratégico e o tático e ancorada na cidadania ativa e na inclusão sócio-espácio-cultural. Mais do que smart cities, importa que o novo desenho urbano alcance uma forte correlação positiva socio-física, económico-produtiva e energético-ambiental (logo sustentável) em espaços urbanos híbridos, plurais e humanizados.

No quadro dos avanços verificados em práticas colaborativas na cocriação da nova arquitetura urbana, a par da crescente relevância do rastreamento, mapeamento, análise e visualização de big data/crowd data no codesign de espaços urbanos responsivos e topológicos, consolida-se o recurso a métodos formais (Viana et al., 2018) no novo desenho urbano. A par dos sistemas de informação geográfica (SIG), âmbitos como o das ontologias, City Information Modelling (CIM), análise configuracional, autómatas celulares e simulações agent-based aproximam o novo desenho urbano à morfologia urbana. No âmago desta relação consubstancia-se o e-planning assente em standards mais elevados de “engajamento” social – e.g., por via da geo-participação digital (e-participation). Novos modos de comunicação em rede, interfaces digitais, aplicativos móveis e sensores para recolha e processamento de dados permitem explorar múltiplas perspetivas para o novo desenho urbano, principalmente como processo de ação-prática (e não tanto enquanto disciplina teórica formal).

A transitoriedade de fluxos e movimentos, o desdobramento de vivências e dinâmicas socio-urbanas e o cuidado com recursos e meios disponíveis compaginam o novo desenho urbano em sistema aberto, organizado a partir de abordagens incrementais, ou seja, que não promove saltos no “vazio”, mas segue “trilhos” relacionais e emergentes, de modo a melhor acondicionar as mudanças aceleradas que hoje se constatam (e que no futuro se acentuarão) na arquitetura urbana. Visto isto, o novo desenho urbano tende a acolher metodologias relacionais próprias do paradigma relacional (sistemas abertos; formas livres; absorção do que é alheio, exterior), alojando o irregular, a aparente desordem e a inovação auto-organizada através de ações imitadoras criativas (Lemaire, 1997). Atende, assim, à indeterminação, instabilidade e incoerência (o fator in, designado por Gausa (2007)) de muitos dos atuais processos de urbanização.

A configuração inteligente da nova arquitetura urbana coloca ênfase no equilíbrio e feedback entre os sistemas que participam no desenvolvimento integrado de espaços urbanos contextualmente participados e tecnologicamente (infra)estruturados. Conforme Batty (2018), em Inventing Future Cities (The MIT Press), o debate recentra-se no planeamento urbano, no design, na tecnologia, no impacto das novas infraestruturas e dos novos padrões de vida e de trabalho e, acima de tudo, na dinâmica digital que tem afetado todos os aspetos da vida, presente e futura (e.g., teletrabalho, comércio e serviços online). Em síntese, como refere este autor, a principal questão prende-se em como inventar (e não predizer) o futuro das cidades.


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