Artigos de Opinião

Ana Rita Antunes: “Pobreza energética – um novo nome para um problema antigo”

Ana Rita Antunes,
Coordenadora Executiva da Coopérnico

A pobreza energética ganhou um foco como nunca antes, ainda que o problema não seja novo. É fundamental que este momento seja aproveitado para uma redução deste fenómeno em Portugal, ao mesmo tempo que os cidadãos ganham qualidade de vida.

Em 2019, foi divulgado o primeiro estudo[1] realizado à escala europeia e que evidenciava a verdadeira dimensão da pobreza energética, com uma prevalência destacada nos países do Sul e Leste Europeu. Portugal era o 4º país europeu com maior nível de pobreza energética.

Em Portugal, bem como em outros países europeus, o assunto é sério: existe uma elevada iliteracia energética e é necessária a educação e formação para o tema, para aliviar e combatermos a pobreza energética no país. A participação dos cidadãos para a resolução do problema é essencial para o sucesso do objetivo.

Algumas iniciativas à escala europeia já têm surgido, e a Coopérnico, Cooperativa portuguesa de energias renováveis, abraçou a coordenação do projeto Powerpoor em Portugal, uma iniciativa da União Europeia financiada pelo Horizonte 2020 em dois milhões de euros para combater a pobreza energética. Teve início em setembro de 2020 e ambiciona tirar da pobreza energética mais de 22.000 famílias europeias até 2023. Para tal, estão a ser desenvolvidos programas e modelos de apoio a cidadãos em pobreza energética, e ainda a ser feitos esforços para incentivar ao uso de modelos de financiamento alternativos (por exemplo, estabelecer comunidades locais de energia, crowdfunding, crowdlending, entre outros). O objetivo é facilitar a partilha de experiências, boas práticas e conhecimentos, bem como implementar intervenções de eficiência energética em pequena escala e instalar fontes de energia renováveis, aumentando a participação dos cidadãos.

Em Portugal, nos últimos meses, a Coopérnico tem trabalhado para o desenvolvimento de uma rede de Apoiantes de Energia e Mentores de Comunidades de Energia para ajudar no terreno os cidadãos, bem como a organizar iniciativas para a consciencialização e capacitação, tais como webinars e workshops sobre a temática da pobreza energética e medidas de mitigação do problema. Em junho decorreu o primeiro momento de formação levado a cabo no âmbito do POWERPOOR, para técnicos de autarquias, juntas de freguesias, agências de energia e instituições de solidariedade social. Espera-se que desta formação[2] saiam:

  • Apoiantes de Energia – têm como missão identificar e envolver os cidadãos com dificuldade em pagar as faturas de energia elétrica, para que os possam ajudar fornecendo apoio técnico, quer seja no uso das ferramentas de apoio desenvolvidas pelo POWERPOOR, quer seja a implementar as ações de eficiência energética ou as mudanças comportamentais relacionadas com o consumo de energia.
  • Mentores de Comunidades de Energia – têm como missão fornecer apoio em todas as áreas-chave associadas à criação de uma comunidade local de energia e/ou à sua operação. Os Mentores terão ainda formação para poderem apoiar a criação e operação de Gabinetes Locais de Apoio à Pobreza de Energia.

O projeto POWERPOOR[3] vai desenvolver programas de mitigação da pobreza energética em mais 7 países europeus – Bulgária, Croácia, Estónia, Grécia, Hungria, Letónia, e Espanha – que além de Portugal são dos países mais afetados pela pobreza energética a nível europeu.

Para além deste projeto outras entidades portuguesas estão envolvidas em projetos europeus de combate à pobreza energética, como o STEP[4] e ASSIST2GETHER[5]. Para além destes projetos, a Coopérnico vai ainda participar noutro projeto de partilha de conhecimento entre cooperativas europeias de energia, sobre boas práticas de combate à pobreza energética entre os cidadãos que integram as nossas cooperativas. Agências de Energia, como a Agência de Energia do Porto, estão também a desenvolver projetos nacionais de combate à pobreza energética.

Outro esforço levado a cabo em 2021, foi a participação na consulta pública, é a Estratégia Nacional de Longo Prazo para o Combate à Pobreza Energética, onde a Coopérnico aliou-se a outras sete entidades – CENSE-FCT/NOVA, DECO, OBSERVA/ICS-ULisboa, Lisboa E-Nova, RNAE, S.ENERGIA, e Zero – para, em conjunto, submeterem um parecer com as preocupações comuns e partilha de conhecimento com o objetivo de melhorar a Estratégia apresentada. Desta consulta pública fica a convicção que a Estratégia apresentada é um bom ponto de partida para uma reflexão e princípio de atuação e agora é preciso a sua concretização com um plano de ação que concretize as medidas apresentadas, com mecanismos que conjuguem financiamento público e privado e uma apertada grelha de indicadores que permitam aferir os resultados conseguidos e fazer ajustes, se for necessário.

Por último, é fundamental a criação de uma plataforma que reúna uma rede de projetos e um centro de conhecimento português – e.g. Observatório Português de Pobreza Energética com participação das principais entidades a trabalhar no tema (universidades, agentes locais, entidades públicas, ONG, associações de apoio social) para monitorização da evolução da pobreza energética no país, troca de experiências, divulgação de boas práticas, criação de sinergias e aumento do impacto real na sociedade inserido no modelo de governação idealizado.

Este é o momento ideal para um combate à pobreza energética e não podemos perder a oportunidade.


[1] https://zero.ong/portugal-e-o-4o-pais-europeu-com-maior-nivel-de-pobreza-energetica/

[2] Para saber mais sobre o POWERPOOR em Portugal, contacte a Coopérnico (coopernico@coopernico.org)

[3] https://powerpoor.eu/

[4] https://www.stepenergy.eu/

[5] http://www.assist2gether.eu/

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